segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

ADEUS, MENINA MÁ


A menina má termina aqui suas confissões. Não porque não seja mais má ou porque não tenha  mais o que confessar. Simplesmente, porque ela mudou. E porque mudou, já não conseguia mais postar aqui. Essa é, pois, a sua última confissão.

Foram textos sinceros, vindos de sentimentos sinceros, dúvidas sinceras, crenças sinceras. E a graça da vida é essa, a gente a escreve e reescreve. Escolhe o caminho que quer viver, se gosta fica, se não gosta às vezes fica também. E muda, se não gosta, e se gosta também. Vira a página, dá uma guinada, enfim, estamos aqui para experimentar. E experimentando seguimos vivendo até o fim. 

Morre aqui meu amor pelo drama. A criança nerd e solitária que sempre fui talvez tenha lido romances demais. Sim, Cathy e Heathcliff, vocês destruíram suas vidas e isso não foi amor. Talvez  seja culpa dos Wuthering Heights, que deixavam tudo sombrio. Talvez por conta dessa violência tenebrosa dos Windy Moors vocês acreditassem que esse medo e essa loucura que os unia fosse amor. Só que não era não. Amor é o que faz a gente feliz. Que libera endorfinas, serotonina e oxitocina, hormônios do bem. Que nos faz produtivos, e não destrutivos. Drama não é amor. Sofrimento não é amor. Amor facilita a vida, não dificulta. Ninguém trata mal e abandona o outro por amor. 

O que a menina má tem a dizer em sua partida, é que, de tudo o que passou, ficou a descoberta tão simples de que o sentido da vida é procurar prazer. Prazer em tudo, seja nos relacionamentos amorosos, seja nas amizades, seja no trabalho, seja no lazer. Em tudo. Pense sempre nisso. Se na balança você estiver lutando demais para obter prazer, lutando sozinho, desista. A vida é cheia de opções, não gaste energia à toa. Talvez você esteja desperdiçando tanta energia em um só caminho, que não consegue perceber tantos outros que estão à sua frente. E tudo aquilo que é feito para funcionar, flui naturalmente. A adaptação é leve, sem sofrimento. Simplesmente, flui. Água parada apodrece. Ou dá mosquito da dengue e zika.

Isso não é uma apologia à preguiça não. Resiliente é aquele que não desiste de nadar a favor da corrente. Quem nada contra ela é só um teimoso. Ou um equivocado. Basta então procurar a correnteza certa. Para ir bem longe. Quem sabe voar? 





domingo, 9 de novembro de 2014

Malévola, a menina má


Finalmente assisti "Malévola". Estou verdadeiramente impressionada e feliz. 

Essas releituras de contos de fadas são realmente fascinantes. Cada uma delas mereceria uma homenagem especial. 

Sempre penso nos efeitos maléficos dos contos de fadas tradicionais nas mulheres da minha geração, das anteriores e também das posteriores. Através deles aprendemos que a redenção de todos os nossos males aconteceria através de um príncipe encantado poderoso que nos encontraria e nos salvaria. O único problema é que esse ser maravilhoso escolheria dentre todas nós a que fosse a mais bela, a mais pura, a mais bondosa, a mais perfeita. Ser perfeita tinha como prêmio ser escolhida pelo mais perfeito dos homens. Ou, ser escolhida significava que realmente tivemos sucesso em nossa formação como ser humano feminino. Não ser escolhida significava, portanto, o fracassso. Quanto mais homens nos escolhessem, mais bem sucedidas seríamos.

As consequências disso são terríveis. Crescemos nos preparando para ser escolhidas, apesar de todo o feminismo e suposta emancipação. Pior que isso, crescemos querendo ser melhores que a nossa coleguinha ao lado, por mais querida e amiga que ela seja, pois a premiada será apenas uma, a melhor. E pior, ser escolhida ainda tem o sabor da vitória, do prêmio por todos os esforços. No mais das vezes, o prêmio nem pode ser tão bom assim, mas saber-se melhor que a outra... ah, isso sim vale o esforço.

Competitivas e pouco solidárias. Qualquer mulher genial torna-se uma suposta inimiga. Tornamo-nos destruidoras umas das outras. Dá-lhe dietas da moda, cirurgias plásticas, reconstrução de cabelos, fortunas em roupas, maquiagem. Ser bonita passou a ser um investimento.

Pois as releituras e os novos contos de fada invertem a história e me enchem de esperança. Neles, os homens existem. Mas são parceiros e companheiros, jamais salvadores. A vitória surge através do amor,  mas não do amor romântico. Valoriza-se especialmente o amor amizade, o amor companheirismo, esse que ultrapassa o desejo em que se lastreia o amor romântico, que é um amor tão frágil e fugaz quanto os desmandos de nosso humor.

Imagino a geração que se forma através dessas informações. Imagino uma geração de meninas felizes, capazes de detectar os próprios desejos e lutar por eles. Uma geração de meninas amigas e companheiras.

Imagino especialmente um mundo em que a beleza feminina finalmente se manifestará, a partir do universo interior rico que essas meninas construirão. Pois nada torna uma mulher mais linda do que a feminilidade que brota do amor próprio. Botox, silicone e lipoaspiração, vocês estão com os dias contados. Deixaremos de ser bonecas e nos tornaremos finalmente mulheres.


segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Ciranda


 Amor é assim, movimento. Porque quando amor fica tranquilo demais, vira irmandade, vira amizade. E não é que seja ruim quando é assim, não. Só não tem graça. Não tem frio na barriga, mas também não tem alegria.

 Dá pra viver sem amor que chacoalha a gente sim. Dá pra viver sem medo de perder, sem querer estrangular, sem essa instabilidade toda que amor demais gera. Tanta gente vive desse jeito. É escolha, para que tanta emoção, compadre?

  Amor que chacoalha é pólvora. Tira o sono, tira a calma, tira as estribeiras. Mas e aí, você faz o que? Mata? Que nada, o desgraçado não morre, e um dia você descobre que vai ser assim mesmo, um deus nos acuda, um tal de ceder aqui, um mudar ali, um amar antes de tudo a diferença. E que só funciona quando você se entrega a isso tudo.

  A gente vive como quer, como escolhe. Pode passar a vida inteira igual, nesse calorzinho do conforto que não tem fim.  E pode escolher a vida em movimento, mas ah, que sofrimento.

  Então a equação não fecha nunca? Conforto mais calor, vida sempre igual, que tristeza, que tédio. Novidade e mudança, vida que se transforma, que instabilidade, que sofrimento.

  É meu amigo, perfeição não existe não. A gente está na vida para aprender a dançar no meio dessa confusão toda. Que se você aprende a dançar o tédio nem é tão tédio assim e o sofrimento nem é tão sofrimento assim. Vira tudo uma grande brincadeira.

sábado, 25 de janeiro de 2014

Sobre tombos e bikes



Caí da bicicleta, tombo feio. Capotei no chão, voei. Me ralei inteira, as pancadas no chão deixaram meu corpo todo dolorido. Não sei bem o que aconteceu. Ou sei lá, acho que sei.

Eu estava com raiva. O pedal quebrado não enganchava minha sapatilha, toda vez eu lá, tentando, duas, três, quatro vezes até dar certo. Além disso, o velocímetro, com a base quebrada, dava mau contato e não mostrava nem minha velocidade nem a distância percorrida.  Eu pedalava com toda a minha raiva, com toda a força que a raiva produz. Não fui eu quem quebrou o pedal, e muito menos o velocímetro. Foi um amor, daqueles que queremos que virem logo um ex-amor, mas fica lá, grudado na gente, teimoso, lembrando que existe a toda hora. Pegou minha bike emprestada, e me devolveu assim. E a cada pé mal enganchado, a cada mau contato do velocímetro, era dele que eu lembrava, e era dele que eu não queria lembrar. Até cair no chão. E trocar a dor da raiva pela dor no corpo.

Caí, mal me mexia, muita dor, braços, pernas e rosto ralados. Fui socorrida, disse a todos que estava tudo bem, dei um sorriso e continuei pedalando. Já não estava mais com tanta raiva. Já não me lembrava mais de nada nem de ninguém, só prestava atenção no meu corpo e na minha dor.

Na verdade, eu só queria que ele tivesse me devolvido a bike exatamente como a pegou. Mais ou menos como a minha vida. Queria que ele pudesse me devolver a minha vida, exatamente como ela era antes de eu ter permitido que ele pegasse emprestada. Não me arrependo de ter emprestado, nem minha vida nem minha bike. Queria apenas que ele reparasse os estragos. Pensei que talvez, sem os estragos, fosse mais fácil esquecer tudo o que se passou.

Agora o corpo todo dói, e dor física nos obriga a ficar quietos. E ficar quieto é a melhor forma de fazer as pazes consigo mesmo. É a melhor maneira de perceber o que acontece conosco quando não cuidamos da nossa única e verdadeira casa, o corpo. E quando você começa a cuidar com carinho do seu corpo, começa a se olhar com mais carinho também. Consegue perceber o quanto nos forçamos a coisas que não somos ainda capazes de realizar, e talvez nunca sejamos. Percebe que tudo tem que estar limpo e organizado para funcionar. Que cada parte de nosso corpo, assim como nós mesmos, tem um ritmo. E que se você não respeita esse tempo, o resultado é cada vez mais dor. A dor é o sinal que o corpo manda quando ultrapassamos nossos limites. É a hora de ficar quieto e observar o que está errado. Ela é sábia. Devemos aprender a ouvi-la, sempre. As dores do corpo e as dores do coração. Para viver sem dor, basta não se agredir. 

Eu estava com raiva porque queria que ao menos os estragos da minha bike ele reparasse, já que os da minha vida eu sempre soube que não seria possível. E achava que assim sentiria bem menos raiva. Mas isso não vai acontecer. Machuquei meu corpo para entender isso. As pessoas não agem como gostaríamos que agissem. Elas causam danos e nem percebem. Acham que não é necessário arrumar nada. E realmente, os danos existem apenas para nós mesmos. Portanto, só nós podemos saber onde estão os estragos e o que realmente nos incomoda.

Arrumei a bike. Ela não está novinha, mas eliminei os problemas que tanto me incomodavam. Assim que passar a dor no corpo, vou girar com ela por aí. E tenho certeza de que nem vou me lembrar que um dia ela esteve danificada. Não é exatamente a mesma bike que era antes de eu ter emprestado. Mas tudo bem, está pronta para rodar. 

Igualzinho à minha vida. Ninguém pode reparar os danos que só eu sei quais são, apenas eu mesma. E ninguém pode me devolver quem eu fui. Só sei que assim que estiver arrumada ela vai girar por aí, pronta para conhecer novos lugares. E para ser emprestada de novo, quantas vezes forem necessárias. Porque vida, assim como a bike, só existe quando alguém as toca, usa, suja, estraga, amassa, arruma, estraga de novo, lava. Bike gasta tem história para contar. E vida também tem que ter muitas histórias para contar. Por isso, vamos lá gastar a vida.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Carta para o meu paizinho



Paizinho

Vou passar o réveillon no sertão da Paraíba, acredita? Pedalando. Estou muito contente. Vai ser diferente de todos os outros anos novos que vivi. Precisava contar para você. Fiquei um pouco triste porque percebi que desta vez não vou poder te mostrar as fotos, nem vou poder te contar como foi, o que vivi de diferente. Você gostava tanto de saber. Aliás, foi você que me ensinou a ter tanta vontade de conhecer o mundo. Eu achava geografia muito chato. Então você me ensinou a viajar mundo afora através de mapas. Das notícias nos jornais. Eu adorava olhar mapas com você. E acabei gostando mais de estudar geografia também. 

Você só não se interessava muito pelas minhas viagens para a Europa, lembra? Falava que não gostava de ver edifícios velhos. Gostava de ver coisas modernas. Na verdade você não gostava mesmo era de olhar para trás.  Talvez pela infância tão pobre e tão difícil, a você só interessava o que estava por vir. Você adorava o que era bonito. Você sempre dizia que gostava mesmo era do agora, que nunca sentia saudades do que passou.

É, eu vou passar a primeira virada do ano sem você longe da mãe. Eu sei que você me pediu para que parássemos de brigar e ficássemos juntas, cuidando uma da outra. Mas eu não sou como você, pai. Eu sou egoísta. Não consigo cuidar dela como você fazia. Eu preciso ver o mundo. Eu preciso ficar um pouco longe dela para poder gostar. Eu cuido, paizinho, mas do meu jeito. Meu jeito meio distante. A gente vai se acertar, eu prometo. Mesmo sem você para apartar as nossas brigas.

Sabe o que é mais engraçado? É que só agora acho que percebi que você foi embora. Agora que não tenho mais para quem contar sobre a minha viagem nova. E que não vou mais procurar algum souvenir divertido para trazer para você. Você adorava meus presentes de turista, usava todos. Ficava engraçado com os bonés e camisetas que eu trazia. Usava todos, e dizia orgulhoso para todo mundo que eram presentes meus. Eu sei que você viajava mundo afora comigo, através deles.

Lembra aquele dia em que disse a você que era o melhor pai do mundo? Você disse obrigado. Obrigada digo eu, paizinho. Por ter me amado tanto. Por ter sido tão honesto sua vida inteira. Por ter me ensinado a nunca mentir. A nunca trapacear. A nunca furar filas. A nunca querer tirar vantagem dos outros. A falar a verdade sempre, e aguentar a consequência dos meus atos. A me preocupar com as outras pessoas, mesmo aquelas que eu nem conheço e talvez nem veja de novo. Por me ensinar que não importa o que os outros digam, faça sempre o que acha que é certo. E me ensinar a respeitar não só pessoas, mas também animais. Por me ensinar a ser feliz com aquilo que sou capaz de obter, pelo meu próprio esforço. Por me ensinar a lutar pelo que eu quero, sem depender de ninguém.

Nesse mesmo dia você me disse que sempre era alegre, que sempre gostou de tudo que a vida oferecia. Mas que não sabia porque estava triste. Eu abracei você bem forte e você disse que passou. E me agradeceu por estar ali, ao seu lado. Paizinho, você gostava tanto da vida. Dava tanto valor a cada coisa pequena. Eu queria poder ter te dado o mundo, sabia? Mas você me ensinou que o mundo era cada coisa pequena que eu te dava. Você nunca entendia porque as pessoas eram infelizes. 

Paizinho, eu estou com saudade. Saudade de você reclamando do jeito como eu dirijo. Saudade das frutas gostosas que você me comprava. Saudade de ouvir as coisas bonitas que você me falava. Saudade de você reclamando da minha desorganização.

Mas é só saudade, paizinho. Saudade boa. Pois como foi bom viver com você. Eu sei que não consegui aprender tudo o que você queria me ensinar. Mas prometo que cada palavra sua, cada gesto seu, ecoam o tempo todo em meu coração. E prometo que, um dia, vou conseguir fazer tudo direitinho. Prometo.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Do tamanho do meu sonho



Sonhar é bom, mas não é tão simples assim quanto parece. Quantas vezes você já se imaginou sonhando e se perdeu no meio do caminho? Estava no meio do delírio, se divertindo, mas de repente ficou sem saber para onde ir? E de repente, você acaba mesmo é desistindo do seu sonho. Simplesmente porque não sabia como terminá-lo. 

As pessoas dizem que gostam de fazer inúmeras e variadas coisas, que são tantas as paixões, tantos os sonhos e tudo mais, que por isso uma vida só parece pouco para realizar. Ou então, que é muito difícil realizar os sonhos e por isso desistem antes mesmo de tentar. Mas sabe qual é, na realidade? A maioria não sabe bem onde termina nem onde começa o sonho. Então saem por aí fazendo tudo o que supostamente parece lhes dá prazer, sem saber muito bem para que.  E vamos para a aula de piano, de ballet, de culinária, o curso de história da arte, de filosofia grega, aula de russo, de inglês, de tênis, de origami, e sei lá mais o que. Tudo divertido por um tanto, mas e depois, para onde se vai?

A mesma coisa acontece com os amores. Tantas pessoas fascinantes no mundo, tanto a se conhecer, tanto a se trocar. Mas o tempo passa, o fascínio da descoberta se esgota, e pouco resta a partir daí. Também divertido, mas e agora, para onde se vai?

E é aí que surge o tal do propósito. Você já parou para pensar na razão da sua existência? Escrever um livro, plantar uma árvore, ter um filho? Clichê, mas na realidade quem tem esses propósitos sabe exatamente aonde quer ir. Ora, quero ter uma casa de campo para plantar uma árvore. Quero um parceiro de caráter para cultivar um bom relacionamento e criar um filho. Quero estudar determinado assunto para escrever um livro.

Mas calma, isso não significa que você está transformando a sua vida num plano de metas de uma empresa. Não é assim, tão rígido quanto parece. Você apenas tem que saber onde quer chegar. Você pode inclusive perder-se, e assim descobrir outros caminhos, e aprender o inesperado. Não há pressa em chegar. O que importa mesmo é saber onde se quer chegar. E às vezes, quanto mais vezes a gente se perde, mais o caminho se torna divertido.

Quem não tem propósito não consegue sonhar, porque sonhar é imaginar o lugar onde se quer chegar. Se você não sabe onde quer chegar, como sonhar? E o que é sonhar? É colorir aquele lugar que imaginamos para nós mesmos.

Então desistimos do trabalho, porque perdeu a graça. E desistimos da aula de russo, porque não vai ter utilidade alguma. E trocamos de namorado, porque o fascínio da descoberta se passou, porque ele não era bem aquilo que imaginávamos. Mas… o que imaginávamos mesmo?

Trabalho bom é aquele que está vinculado a um ideal. E aprender coisas novas só é verdadeiramente bom se pretendemos modificar a nós mesmos e depois transmitir o conhecimento, de alguma maneira. E amor bom é aquele que nos faz crescer, que nos desafia, dia após dia, e que nos impulsiona em nossos propósitos. Um amor bom fornece combustível. Já o amor falso, esse mina todos os nossos propósitos, pois pensa apenas em alimentar a si próprio.

Pois não é o caminho que importa, o que importa é saber onde se quer chegar. Querer aquilo que reflita o seu ideal. Sabendo o seu ideal, fica fácil sonhar. Sonhar com seu trabalho, onde você morar, quais os amigos quer ter, o que quer aprender, quem você vai amar. Fica fácil rodear-se daquilo que lhe faz bem. Perder-se mas saber para onde olhar. 

Quem tudo quer, não sai do lugar. Gira em círculos, fica preso dentro de si mesmo. Não conclui sequer o seu sonho, porque nem sabe como quer que ele termine. Simples assim, tão óbvio. Mas tão difícil ao mesmo tempo, tão fácil ceder a tudo que dá prazer temporário!

Sonhar com começo, meio e fim. Taí uma coisa que a gente devia era aprender na escola. 

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Mas eu me mordo de ciúme!



Eu já me mordi de ciúme sim. Já fiz cenas terríveis, daquelas dignas de filme. Já falei bobagens, tudo igualzinho à música do Ultraje. Mas também, quem nunca fez isso que atire a primeira pedra. Duvido de verdade de quem diz nunca sentir ciúme. É inerente ao ser humano. Você pode às vezes nem sentir ciúme do seu namorado, mas será que não sente do seu amigo? Ou do seu pai, da sua mãe, do cachorrinho, do priminho, ou da sua coleção de canetas? Pois é, a gente precisa de algo pra chamar de meu, seja lá o o que for.

Já interpretei o ciúme como medo de abandono, como insegurança, como desvio de paixão, ou sei lá quantos outros clichês. O resultado dessas definições é que isso coloca o ciumento no papel de vítima. Aliás, ser vítima é uma situação muito cômoda, pois essa é a qualidade da criatura que precisa ser salva de alguma maneira. Toda vez que nos vitimizamos, colocamos a nossa salvação nas mãos de outra pessoa. Sim, o problema de entender o ciúme dessa maneira transporta toda a culpa para o objeto do ciúme. Porque, afinal de contas, é o objeto do ciúme que não está compreendendo as necessidades do ciumento, esse ser tão frágil, que sofre tanto. E todo o mundo se compadece do pobre coitado, e se solidariza, e tenta ajudar. Na verdade, todos nos identificamos com o ciumento.

Mas não é que ouvi de um amigo a seguinte definição: "Ciúme não é nada disso, é apego. É necessidade de controle." 

Pois vejam só. Não é que de repente o pobre do ciumento passa da qualidade de vítima para a de algoz? O ciumento na realidade é um controlador. Ele não tem medo de ser abandonado, ele apenas quer controlar. Quer saber de todos os passos da outra pessoa, mas não para compartilhar experiências. A curiosidade do ciumento vem da sua necessidade de influir nas decisões dessa outra pessoa. Ciumento fica infeliz se o outro está feliz sem que ele tenha interferido em nada para que isso aconteça. Ele quer participar de tudo, para criar uma dependência e, assim, ter satisfeita a sua necessidade de controle.

Medo de abandono todos temos. Insegurança, idem. Mas não é isso que gera o ciúme não. Porque o ciúme é um sentimento devastador, que provoca destruição por onde passa. Destrói momentos bons, sentimentos bons, destrói histórias inteiras. Ele cega os nossos atos. E tudo por que? Porque pensamos que, quando controlamos, estamos seguros. Assim entendem os ditadores, os tiranos. O problema é que é simplesmente impossível ter controle sobre qualquer pessoa. Por isso, nenhuma ditadura ou tirania prevalece por muito tempo. Porque é impossível ter controle sobre pessoas infelizes. Pessoas infelizes normalmente se revoltam. E com violência.

Por todas essas razões, descobri o quanto é horrível ser ciumento. Não é bom descobrir-se tirano. Ao contrário do que dizem as novelas da TV, isso não tem nada a ver com amor. Amor é parceria de vida, é um bem querer, é uma troca de experiências, de vidas distintas que se cruzam em um determinado ponto. Amor é preciosidade que não se encontra em qualquer canto. O ciumento não troca, ele suga. Quer informações, quer ser o único responsável pela felicidade do outro, pois sabe que é um embuste, que tem pouco a oferecer. 

Ok, ainda me mordo de ciúme, pois é difícil libertar-se completamente desse traço humano tão egoísta. Mas vamos dizer que agora apenas mordisco. Pois toda vez que volto a ter esse sentimento, penso no quanto seria horrível se alguém pretendesse ser a minha exclusiva fonte de felicidade. Se alguém quisesse me tiranizar a ponto de me impedir de aprender com meus próprios erros. Se alguém me achasse tão incapaz a ponto de se achar no direito de decidir o que é melhor para mim. 

É muito mais gostoso compartilhar do que exigir explicações. Afinal de contas, amor de verdade não surge por aí, a cada esquina, ele é construído, dia após dia. E por ser tão raro e tão poderoso, apenas nós mesmos somos capazes de destruir um amor. Então, não vale a pena perder tanto tempo controlando a vida do outro. Controlar a própria vida já é algo deveras trabalhoso, pois não.

E por fim, se aquele medinho egoísta bater de novo, não pense em tirar nada de ninguém. Não pense em apequenar. Simplesmente preencha a si mesmo, até transbordar. Pois amor gigante só surge entre pessoas igualmente gigantes. 

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Orquídeas




E de repente, minha orquídea floresceu lindamente. Para o meu completo espanto, já que nunca cuidei dela desde que as últimas flores se foram. Ganhei a planta no meu aniversário do ano passado, de alguém muito querido. Mas as flores se foram, e me esqueci completamente dela, deixei-a simplesmente em minha varanda, ao sabor do sol, chuva e vento.

Não sei cuidar de algo tão delicado como plantas, elas não reclamam nem demandam atenção como os meus gatos, e por isso acabo me esquecendo delas. Só me dou conta de que estão descuidadas quando vejo folhas que deveriam ser verdes, tornando-se amareladas. Admito, é uma completa incapacidade de cuidar daquilo que não clama minha atenção.

Mas para minha surpresa, a orquídea, tão delicada, floresceu. Uma planta que, em sua origem, nasce em qualquer canto, em lugares inóspitos, e sobrevive daquilo que existe em seu ambiente, aproveita-se daquilo que lhe é oferecido, e devolve, em troca do pouco que recebe, flores lindas, genuínas e muito resistentes. Sim, existe mais este detalhe a respeito das orquídeas. Suas flores resistem mais do que quaisquer outras.

E não é que a vida é também desse jeito? Tudo o que é bom acontece sem esforço, de maneira natural, sem que percebamos que está acontecendo. Contornamos um probleminha aqui e ali, um contratempo qualquer, e, de repente, sem perceber, temos algo grandioso em nossas mãos. E nem notamos que estávamos construindo algo. Assim, são os grandes amores, as grandes amizades, os grandes trabalhos, as grandes conquistas de nossa vida. 

Mas já que é de amores que gostamos de falar, vamos falar de amor. Pois então, lembre-se de uma história de amor boa da sua vida. Amor bom surge devagarinho, normalmente a partir de uma conversa descompromissada, em que não estávamos pensando em seduzir. Estávamos ali, de cara lavada, calça jeans, camiseta branca, o perfume do banho apenas, rindo de qualquer coisa, contando qualquer história sobre nada. Ninguém pensava em impressionar, então nem havia a necessidade de mostrar o seu melhor lado. Ninguém também estava interessado em concordar com as idéias do outro, já que ninguém estava preocupado em agradar. E a conversa fluía, sem pé nem cabeça, um deboche só. E aquela pessoa até irritava um pouquinho, que pedante, quem ela pensa que é, para me contrariar tanto desse jeito. Mas mesmo assim, foi tão gostoso que deu vontade de repetir. E você começa a repetir cada vez mais, e é com aquela pessoa que você percebe que perde o senso do ridículo, e com quem você tem as discussões políticas, comportamentais e ideológicas mais absurdas. E às vezes você nem suporta a pessoa, mas mesmo assim, é com essa pessoa que você produz as flores mais lindas e resistentes. Nas condições mais inóspitas. Pois é, foi natural, você nem queria se apaixonar por aquela pessoa, aliás, no começo você até pensou, que pessoa esquisita, mas é que no fundo você sabia que era esquisito também.  

Flores esplendorosas até surgem em condições pouco naturais, a partir dos cuidados, da adaptação climática, do adubo correto na hora correta, da água devidamente tratada, da reposição dos sais minerais em sua terra. Surgem, são lindas, mas não são duradouras. Se você esquecer de algum detalhe, provavelmente colocará tudo a perder. E o processo deve reiniciar, e uma hora você se cansa, tanta energia gasta. 

Por isso estou tão apaixonada pelas lindas flores da minha orquídea. Elas surgiram para alegrar a minha casa simplesmente, apesar da dona maluca, distraída e descuidada. Mostraram que estão ali, por elas mesmas, e eu não tive que realizar mudança drástica nenhuma em mim mesma para que elas sobrevivessem. 

O natural da vida é ser natural. Ficamos nos inventando todos os dias, nos forçando a nos adaptar, a agradar, a ser aceitos, mas, na verdade, basta apenas existir, do jeito que você é. E produzir suas mais lindas flores com tudo aquilo que estiver ao seu redor. E para isso, basta se reconhecer naquilo que está ao seu redor.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Reaprendendo



Estou reaprendendo a nadar. Pois é, nado desde criança e descobri agora que minhas braçadas são horríveis, por isso o deslize é tão ruim. E aí, vamos lá mudar tudo. Exercícios educativos e mais exercícios, cheguei a sair da piscina em alguns dias com dores de cabeça, de tanto que é complicado ordenar ao próprio corpo que faça algo que ele sempre fez de determinada maneira, de maneira diferente. Por várias vezes pensei em desistir, aliás por várias vezes no meio do treino acabava por me ver repetindo os gestos antigos, tão mais confortáveis.

Vontade mesmo era de deixar pra lá, sempre funcionou, ora essa. Mas o meu espírito caxias não quis desistir, persisti, e olha que no final da semana, no sábado somente, consegui realizar os movimentos, e que surpresa! O nado tornou-se muito mais agradável. Ainda há muito o que treinar, até que os novos movimentos sejam incorporados. Se eu nadar rápido, minhas braçadas ainda retornarão aos movimentos antigos, tão mais introjetados em minhas células.

Parece uma besteira, mas o fato é que a novidade não sai da minha cabeça. Fiquei pensando em como é difícil mudar nossos condicionamentos, aquelas coisas que aprendemos que devem ser feitas de determinada forma em nossa história de vida, mas que nem sempre nos levam à felicidade. Muitos de nossos comportamentos não foram escolhidos, mas impostos pelas circunstâncias em que crescemos. 

Por exemplo, todas nós, meninas, fomos condicionadas a acreditar em príncipes encantados. Que em algum lugar da terra um príncipe nos procura, e irá nos salvar de nossos problemas. E que, quando ele finalmente aparecer e nos resgatar, só então seremos felizes para sempre. Enquanto isso não acontece, estamos adormecidas, aprisionadas. Pois é. Por mais independentes que tenhamos nos tornado, acreditamos nisso. Lógico que algumas em grau menor, outras em grau maior. Tudo depende do quanto de energia você utilizou para mudar essa crença. Essa é a minha maior luta, matar a princesa que existe em mim. Sem perceber, me vejo muitas vezes clamando por socorro, acreditando que um príncipe virá me salvar. Mas de repente, algo me diz que isso não irá acontecer, e sim, a consciência (ufa) aflora e passo a resolver os meus problemas. Vivo assim, nesse jogo de princesa e mulher, o tempo todo.

O problema é que, no caso da natação, existem exercícios educativos. E na vida? A vida não tem exercícios, a vida dá mesmo é porrada, de frente, se segura querida. Quanto mais difícil o seu aprendizado, mais porradas você levará. Cabe a você a escolha, pois. Você pode passar a vida inteira levando porradas. Ou você pode aprender que é possível desviar delas. Basta mudar a braçada. Talvez sejam mínimos detalhes. Talvez seja algo imenso. Talvez você tenha que mudar tudo. Depende do tamanho da porrada, é claro. Aliás, quanto maior a porrada, tenha a certeza, maior é a probabilidade de você estar fazendo tudo muito errado.

Portanto, se você está apanhando demais, reflita. Algo está errado. Mude. Reaprenda. Faça algo surpreendente. Se vai doer? Vai, e muito. Vai doer quase a mesma coisa que as porradas que você tem levado. Vai ser difícil pra caramba, vai dar vontade de desistir, voltar para a segurança do caminho já conhecido. A única diferença é que, quando você aprender o movimento correto, essa dor vai desaparecer. Mas para quem continua no movimento errado, eternas serão as pancadas. E não adianta reclamar.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Vai e vem, vem e vai




Tão iguais e tão diferentes, fadados ao encontro e ao desencontro. Iguais porque diferentes perante o mundo. Diferentes porque tão estranhos o mundo de um ao outro.

Iguais, podiam se defender do mundo. Mundo tão hostil e tão estranho a eles. Juntos, se sentiam fortes, se sentiam protegidos. Simplesmente imbatíveis.

Mas quando confrontados seus mundos, quantas diferenças. Impossível para um compreender o mundo do outro. Separaram-se então.

Separados, são frágeis. Mas juntos, não se entendem.

Assim vão vivendo. Separados e juntos, juntos e separados.

Até o dia em que descobrirem que viver junto é também viver separado.